sábado, 11 de agosto de 2012

GLOSSÁRIO: HISTÓRIA DO IMPRESSIONISMO EUROPEU. ESCOLA (FRANCESA DE) BARBIZON


GLOSSÁRIO: HISTÓRIA DO IMPRESSIONISMO EUROPEU, A ESCOLA (FRANCESA DE) BARBIZON [ÉCOLE DE BARBIZON] (Barbizon, Seine et Marne, c. 1850-1875).

Destaques: MILLET, Jean-François; v. George INNESS, da Escola de Nova York; e William Morris HUNT, da Escola de Boston.

Foram precurssores Jean-Baptiste Camille Corot (1796-1875) e Jean-Desiré-Gustave Courbet (1819-1877); foram expoentes da Escola (Francesa) de Barbizon Jean-François Millet (1814-1867), Narcisse Virgile Diaz de La Peña (1807-1876), Charles Emile Jacque (1813-1894), Jules Breton (1827-1906),Jules Dupré (1811-1889), Théodore Rousseau (1812-1867), Charles-François Daubigny (1817-1878), Adolphe Monticelli (1824-1886) e o animalista, Constant Troyon (1810-1865).
A Escola de Barbizon se formou na rica região rural, em torno da cidade bucólica situada na orla da Floresta de Fontainebleau. Os artistas passaram a pintar diretamente na natureza; na arte européia, até então, as paisagens compareciam como mero acessório, pintadas no fundo de quadros, modificadas, com vários acréscimos de elementos arquitetônicos fictícios, como templos gregos, ruínas romanas ou monumentos no estilo italiano.

Os pintores da Escola de Barbizon foram os primeiros artistas europeus que pintaram na natureza as belas paisagens imersas na luz do verão, quadros que terminavam nos seus estúdios. As suas paisagens receberam a plena influencia do paisagista inglês John Constable e da Escola de Haia (v., posteriormente publicarei).

O pintor dito, animalista, C. Troyon pintou pequenos animais dos campos, tais como pássaros, lebres e raposas, em pinturas sensíveis e naturalistas. Outros, como Dupré e Millet, pintaram sua visão romântica dos camponeses, bem mais interessados nas imagens iluminadas das colheitas banhadas pela luz do verão.
 
No século XIX, em meados da década de 50, os pintores da Escola de Barbizon conheceram o auge de seu sucesso quando suas obras foram adquiridas por uma nova geração de colecionadores de arte. O início da industrialização francesa ofereceu a oportunidade de ascensão social para a nova classe de empreendedores, que se tornaram industriais e financistas. Os novos emergentes apreciaram mais a veracidade das paisagens dos pintores românticos da Escola de Barbizon, do que a arte dita clássica, aceita nos salões, que privilegiava a estética acadêmica da época. Na verdade, a beleza da pintura de Barbizon tornou sua aceitação fácil, inclusive na América, onde o pintor norte-americano William Morris Hunt, que viveu durante prolongada temporada na Europa (1847-1855), grande parte dela passada em Barbizon onde ele se tornou amigo de J.-F. Millet, além de colecionador e divulgador das obras dos pintores de Barbizon quando ele voltou a viver na América.

A denominação de Escola de Barbizon, somente foi cunhada no início do século XX (1900), quando vários dos colecionadores norte-americanos, milionários como William Vanderbilt, Potter Palmer e Henry Clay Frick, se tornaram compradores das pinturas dos artistas dessa região francesa. Quando a América mergulhou na Grande Depressão (1929), se encerrou o primeiro ciclo de comercialização das obras da Escola de Barbizon no mercado de arte norte-americano. No entanto, na década de 1980, colecionadores japoneses voltaram a se interessar em adquirir as agora muito valorizadas pinturas dos artistas de Barbizon.

Vincent van Gogh foi admirador de Daubigny, de Monticelli e de Millet, fato citado nas cartas de Paul Gauguin sobre o artista. Gauguin detestava o grande Daubigny, como Van Gogh chamava o pintor nas suas discussões com ele (1888). Os pintores tinham opiniões conflitantes, como Gauguin relatou nas suas cartas da mesma época, reproduzidas e publicadas (v. PRATHER, 1987). No entanto o estilo bucólico e luminoso dos pintores de Barbizon influenciou sem dúvida a evolução da pintura de V. van Gogh: um pastel de J-F. Millet foi a obra que inspirou o artista holandês a pintar sua conhecida composição Tarde: descanso do trabalho, copia da pintura de Millet conhecida como Descanso do meio-dia. A composição da obra original foi desenhada em tons apagados; porém a pintura de V. van Gogh, é plena na luminosidade do trigo dourado e do céu azul de verão. Os dois quadros se encontram reproduzidos lado a lado (BERMAN, 2002).

Na carta de Vincent van Gogh para Théo (Paris, 6 jul., 1875), ele contou ao irmão que dependurou várias gravuras na parede do pequeno quarto que alugou em Montmartre, e, entre estas reproduções, As Horas do Dia, uma entre quatro lâminas de Gravuras de J.-F. Millet; e colocou sobre sua parede outras duas reproduções de obras de pintores da Escola de Barbizon, a reprodução do precurssor Jean-Baptiste Camille Corot e outra de Charles Daubigny. Na outra carta de Van Gogh (Amsterdã, 3 abril, 1878), o artista citou novamente o quadro As Horas do Dia, de Millet; e, na sua longa carta confessional para Théo (jul., 1880), V. van Gogh citou Rembrandt, Millet e Delacroix. Na carta vinda de Cuesmes (20 ago.), V. van Gogh perguntou se Théo ainda possuía a reprodução de Os Trabalhos do Campo, de Millet, que ele pediu emprestada ao irmão, solicitando que a gravura fosse enviada pelo correio, declarando ainda:
[…] estou rabiscando desenhos grandes à partir de Millet, e estou fazendo As Horas do Dia, assim como O Semeador [...] mas sinto a necessidade de estudar o desenho de figuras em mestres como Millet, Breton, Brion ou Boughton ou outros […]

Nesse caso Vincent citou o pintor Jules Breton, que ele tentou procurar pessoalmente, viajando à pé até Courrières, a aldeia onde Breton vivia; mas, quando chegou em andrajos, o paupérrimo V. van Gogh ficou intimidado com a bela aparência da residência do pintor e não teve coragem de procurá-lo. Nessa mesma carta do artista para Théo, ele declarou ter visto, nesta ocasião, os campos de Courrières, quando escreveu

[…] avistei as nuvens de corvos famosas pelos quadros de Daubigny e de Millet.[…].

As nuvens de corvos marcaram a paisagem de um dos últimos e mais famosos quadros de V. van Gogh, no qual ele pintou um trigal muito amarelo banhado pelo sol, com nuvens de corvos no céu azul, quase um prenúncio de sua morte anunciada. A influência marcante da obra de Millet pairou durante anos a fio sobre a trajetória pessoal e o aprendizado individual de V. van Gogh, que escreveu, nessa mesma carta para Théo:
[…] Mas a pérola preciosa em evidência, a alma humana, nós também a encontramos, mais e melhor, e num tom mais nobre, mais digno e mais evangélico, se me é permitido dizê-lo, em Millet, em Jules Breton, em Josef Israels […]

O pintor do Grupo de Barbizon Jules Breton recebeu a Medalha de Primeira Classe no Salão Nacional de Belas Artes (1859), com a pintura Chamada das Segadeiras na volta para casa (1859, óleo/ tela, 90 cm x 176 cm, no acervo do Museu d' Orsay), verdadeira alegoria sobre camponesas que parecem bem mais do que figuras reais, pintadas como deusas da fartura e da bonança, obra que se encontra reproduzida (BONFANTI-WARREN, 2000: 56-57).

Anton Mauve (1838-1888), pintor holandês, que viveu entre Paris e Oosterbeek, primo de Van Gogh, pintou muitos camponeses, tema frequente da Escola de Barbizon. O primo foi quem propiciou as primeiras lições de pintura a Vincent, no início de sua carreira, o primeiro a reconhecer que ele tinha talento. Na sua carta de Haia, (7 jan., 1882), V. van Gogh declarou:

[…] Parece-me que este quadro de Mauve seria um dos raros quadros diante dos quais
Millet se deteria longamente murmurando Este pintor tem alma. […]

Em outra carta para Théo (abril , 1882), Van Gogh novamente declarou sua admiração por Millet, pois depois que ele leu as Cartas e o Diário de Gérard Bilders:

[…] mas prefiro ler a vida do pai Millet ou de Théodore Rousseau ou de Daubigny
[…]

Todos os citados pertenceram ao grupo de Barbizon, que ainda incluiu os artistas Narcisse Diaz de La Pena, um dos primeiros com Troyon, a radicar-se na região campestre ao lado da floresta de Fontainebleau. Outro pintor que foi viver em Barbizon (1853-) foi Charles Daubigny, que dedicou-se à pintar o efêmero na paisagem, no que foi influente sobre os futuros artistas Impressionistas: o artista foi eleito e tornou-se membro do júri do Salão Nacional de Belas Artes (Paris, 1864). Daubigny foi um dos vanguardistas que ajudaram a sustentar o círculo de amigos de Édouard Manet; ele montou seu estúdio em uma barcaça, com a qual percorreu o rio Sena. Inspirado em Daubigny, quinze anos depois, Claude Monet montou o mesmo tipo de estúdio num pequeno barco, quando Manet pintou dois quadros que se encontram no acervo do Museu d' Orsay (Paris).

Outro artista verista da Escola de Barbizon foi Jean-Desiré-Gustave Courbet, que nasceu no seio de família abastada como a maioria dos integrantes de Barbizon; e Jean-Baptiste-Camille Corot, que passou temporada na Itália, de onde ele trouxe a influência da luz meridional com que os pintores italianos banhavam suas obras românticas, na mesma época que o Realismo Verista dos artistas da Escola de Barbizon buscaram simplificar. Outro artista da escola foi Adolphe Monticelli (v. biografia), artista com o qual V. van Gogh se identificou bastante, pois estudou sua maneira pessoal de pintar, com pesado impasto pictórico e aplicando a cor mais intensa e mesmo o pigmento puro sobre a tela, que inspiraram o holandês. Ao tentar copiar o estilo pictórico de Moticelli, pintando com os mesmos princípios, V. van Gogh encontrou seu estilo pessoal.

Na sua carta (n. 400), Van Gogh declarou:
[…] Estou pensando no que diz Millet: "Não quero suprimir de maneira alguma o sofrimento, pois frequentemente é ele que faz os artistas se expressarem mais enérgicamente [...] Millet é o pai Millet, ou seja, o conselheiro e o guia dos jovens pintores em todos os domínios. [...] Millet disse, "...na arte é preciso dar o sangue […]

E, comentando sobre outros dos artistas vanguardistas belgas:
(Henri) […] De Groux é um dos bons mestres do gênero Millet. [...] para pintar a vida dos camponeses é preciso ser mestre em tantos temas. Que bom é isto sobre os personagens de Millet: seu camponês parece ter sido pintado com a terra que semeia […] (Carta 402).

As referências sobre Millet ficaram mais espaçadas nas suas cartas, depois que V. van Gogh voltou a Amsterdã, ocasião em que ele ficou muito impressionado ao rever obras dos grandes mestres como Rembrandt, Frans Hals e, principalmente, a conhecida obra de Vermeer de Delft.

No final da década de 1850, a influência do estilo de Barbizon atingiu outras regiões norte-americanas, como Boston (1862), onde se formou o núcleo ativo de artistas reunidos em torno da obra de William Morris Hunt, que, passou a pintar no estilo naturalista da Escola de Barbizon. A pintura francesa das vanguardas de Barbizon mostrou pontos de contacto com a pintura dos artistas italianos do Grupo (Napolitano) do Impressionismo Italiano da Escola de Posillipo ou da Escola Napolitana [Scuola di Posillipo ou Scuola Napoletana] e da Escola de Resina ou da Escola da República de Portici [Scuola di Resina ou da República di Portici] cidades próximas à Nápoles, que se tornoram influentes nos grupos artísticos de vanguarda que se desenvolveram no sul da Itália (v. abaixo).

Várias obras dos artistas da Escola de Barbizon, como os quadros A Colheita (1851) de Charles Daubigny; A Dança Matinal das Ninfas (c. 1850), de J-C. Corot; As Segadeiras (1857) de J.-F. Millet; Lago e céu tempestuoso (1865-1867), de Théodore Rousseau; Cervos no riacho em Plaisir-Fontaine, Doubs (1866) de Gustave Courbet; As alturas de Le Jean de Paris, Floresta de Fontainebleau (1867), de Narcisse Diaz de la Peña; e Natureza-morta com jarra branca (1878-1890), de Adolphe Monticelli, todos pertencentes ao acervo do Museu d' Orsay, se encontram reproduzidos (BONFANTE-WARREN, 2000). Os quadros Floresta de Fontainebleau,de Corot, A jovem leiteira de Julien Dupré (1851-1910), e Riacho na floresta de Gustave Courbet (1819-1977), todos no acervo do Museu de Belas Artes de Boston (EUA), se encontram reproduzidos (BERMAN, 2002).

REFERÊNCIAS SELECIONADAS:

ARTIGO. BERMAN, A.; ATHINEOS, D. (Prod. Sotheby's). Bucolic Barbizon. Nova York: Traditional Home, Oct., 2002, pp. 80, 82, 84, 86, 88.

BONFANTE-WARREN, Alexandra. The Musée D' Orsay. New York: Barnes and Noble, 2000, pp. 20-21, 48-49, 56-57, 73, 76, 77, 93-94, 118, 186-188, 278-279.

DICIONÁRIO. DUROZOI, G. Dictionaire de l'art moderne et contemporain. Sous la direction de Gérard Durozoi.
Paris: Fernand Hazam, 1992. 676p.: Il, pp. 189-190.

VAN GOGH, V. Cartas a Théo. Nova edição ampliada, anotada e ilustada. Porto Alegre: L & PM Pocket, vol. 21, jul. 2003, pp. 9, 15, 22, 24, 28, 48, 55, 57, 60, 76, 93, 115, 148, 149, 153, 155, 177.



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