sexta-feira, 17 de outubro de 2014

BIOGRAFIA: DALI, Salvador (1904-1989).

BIOGRAFIA: DALI, Salvador (1904-1989). O artista plástico multimídia, pintor, escultor, cineasta, cenógrafo e escritor, nasceu em Figueiras (Espanha). Dali ficou conhecido no Grupo dos Surrealistas (França), mas depois ele se transformou na personalidade mais marcante na arte do século XX. Desenhista estremamente precoce, pintor que dominava a técnica clássica, o artista criou também sua personae de grande Dandy, que cultivou, tendo como suas marcas registradas a bengala e o bigode torcido para cima. Dali estudou na Escola de Belas Artes (Madri): depois que ele descobriu a Pintura Metafísica de Giorgio de Chirico (1888-1978) e Carlo Carrà (1881-1966), abandonou os estudos (1923). Dalí se associou aos intelectuais espanhóis, ao poeta Federico Garcia Lorca (1898-1936), ao cineasta Luiz Buñuel (1900-1983) e ao artista plástico Joan Miró (1893-1983), que conduziram-no ao seio do Surrealismo. O artista, que tornou-se o maior provocador do grupo do qual foi um dos mais brilhantes representantes nas Artes Plásticas, empreendeu a exploração do insconsciente revelada por Sigmund Freud (1856-1939), denominado por ele de Irracionalidade Concreta. Dali inventou e utilizou na sua pintura o seu método, dito, Paranóico-Crítico, que consistia em deixar que sua delirante imaginação trouxesse à tona todo o inconsciente, para depois controlá-lo na estética de sua matéria pictorica. O artista participou do grupo parisiense de André Breton (1896-1966). Dali passou a provocar escândalos, mas no fundo de toda a polêmica estava o drama maior da personalidade do artista, sua impotência, citada por CANIZAL (2001). O drama pessoal levou-o à busca compensatoria e frenética por dólares e à comercialização excessiva, bem como a falsificação (dizem) de sua própria obra gravada, tanto que recebeu de Breton a perversa alcunha de Avida Dollars [Ávido por Dólares]. No entanto, do ponto de vista puramente artístico, Dali foi quem melhor pôde realizar a fusão da Figuração delirante com a Abstração, realizada na sua técnica pictorica irrepreensível, que o artista sempre executou com incomparável maestria nas suas pinturas com imagens oníricas delirantes. Dali se interessou pelo cinema, a arte da imaginacao espacial e liberta: ele produziu com Luís Buñuel (1904-1983) dois filmes experimentais: Um Cão Andaluz [Un Chien Andalou] (França, abril de 1929, dir. Luís Buñuel, 35 mm, P&B, silencioso, 18' ou 24', versão sonora e musicada, 1960) e A Idade de Ouro [L'Age d'Or] (1930, P&B, S, 62'). No primeiro filme citado Dali colaborou no roteiro, que tinha a intenção de ser crítico e recheado de referências à amizade de ambos, Dali e Buñuel, rompida com Garcia Lorca, conforme citou CANIZAL na sua palestra realizada no CCBB, que se encontra gravada (Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, 2000). Dali foi roteirista, cenógrafo e colaborador do segundo filme, parceria com Buñuel, A Idade de Ouro [L' Âge d'Or] (França, 1930, dir. L. Buñuel, 35 mm, P&B, sonoro, 60'). Esse filme, com roteiro de Buñuel e Dali, edição de Buñuel, fotografia de Albert Duverger, música de Von Parys que adaptou trechos de Beethoven, Mozart, Mendelsohn, Debussy e Wagner, A Idade de Ouro foi filmado na França. Max Ernst (1891-1976), fez o papel do bandido. Essa obra cinematográfica é tida como a mais completa de Buñuel, mas a vigorosa colaboração de Dali merece estudo mais aprofundado. Esse filme, que estreou no Cine Studio 28 (Paris, 28 de nov., 1930), provocou grande escândalo devido ao caráter profano, antireligioso e antiburguês, com a consequente destruíção do cinema, suscitando protestos, tanto dos católicos pertencentes à Liga dos Patriotas, bem como da dita, Liga Antisemita. Os quadros dos artistas plásticos Surrealistas bem como as obras literárias expostas na antesala do cinema, foram destruídas por vândalos. O incidente provocou a intervenção da policia, que apoiou a baderna provocada pelos manifestantes. O cinema foi fechado. O filme, que até hoje é surpreendente na sua modernidade, pôde ser apreciado na mostra Surrealismo: Cinema e Vídeo, concomitante com a exposição de 300 obras dos Surrealistas, realizada no CCBB (Rio de Janeiro, 2001). Por ocasião dos grandes protestos que o filme suscitou, o grupo dos Surrealistas publicou panfleto em defesa de Dali, incluindo a fotografia do cenário de filme e um questionario dirigido ao público perguntando se esse mesmo público apoiava o estabelecimento de métodos fascistas na França, país que sempre prezou, acima de tudo, o respeito à individualidade e a liberdade de expressão. Dali foi convidado a criar a sequência de sonho onírico para o cinema norte-americano, no filme Vínculo da Palavra #[Spellbound] (EUA, 1945, P&B, sonoro, 111', dir. Alfred Hitchcock). Na edição do filme o sonho de Dali foi cortado e deturpado pelo produtor (Selzsnick): esta foi a mais delirante sequência nesse drama de contornos psicologicos, estrelado por Ingrid Bergman e Gregory Peck nos papeis principais. Esse filme também participou da citada mostra no CCBB (2001). Dali criou cenários para Don Juan Tenório (Espanha, 1952), e dirigiu e roterizou outras produções cinematográficas. Dali escreveu vários textos publicados nas revistas Surrealistas, editadas por André Breton e seu grupo. Uma das imagens que Dalí popularizou no século XX foi a do dito, Fenômeno do Êxtase, fotocomposição com colagem das fotografias de Brassai (Gyula Halasz, 1899-1984). Esta composição foi publicada na revista Minotaure [Minotauro] (n. 03/ 04, dez., 1933). Dali ilustrou várias obras Surrealistas, inclusive o livro de André Breton e Paul Éluard (Eugène Émile Paul Grindel, 1895-1952), A Imaculada Conceição [L'Immaculée Conception] (Paris: Ed. José Corti, 1930), no qual Breton não concedeu-lhe o respectivo crédito pelas ilustrações eróticas e antireligiosas. O livro foi censurado e logo retirado de circulação, mas sua edição original esteve presente na Mostra do Surrealismo no CCBB (Rio de Janeiro, RJ, 2001). Dali escreveu muitos textos em francês como Da Beleza Terríficante e Comestível da Arquitetura Moderna [De la beauté térrifiante et comestible de l'architecture moderne], precedida por uma série de fotografias de esculturas involuntárias da vida diária como tubo de pasta de dentes usado, passagem de ônibus velha e dobrada e daí por diante. Dali ainda apresentou várias associações de objetos como no quadro Fogos de Artifício [Feu d'artifice] (1930-1931), montado com inúmeros objetos associados ao combate ao fogo; seu Objeto Escatológico de Funcionamento Simbólico (1931/ 1974, edição de 8, 48 cm x 24 cm x 14 cm, no acervo da Galeria du Dragon, Paris), reproduzido na revista Le SASDLR [O Surrealismo à Serviço da Revolução] (n. 03). Nessa obra Dali utilizou sapato feminino de salto alto, copo de vidro com leite dentro, sugerindo que o leite deveria ser entornado e bebido dentro do sapato, com um cubo de açúcar no qual ele pintou a reprodução da imagem do mesmo sapato suspenso por um fio exatamente sobre o copo de leite, sugerindo a dissolução do açucar no leite e, consequentemente, a dissolução da imagem do sapato. O cubo de açúcar continha pelos púbicos colados; e, junto com essa obra, uma fotografia erótica com outros cubos de açúcar com a mesma imagem do sapato pintada, sugerindo a repetição do procedimento escatológico na fotografia reproduzida (ADES, 1978; BEAUMELLE, 1991). Dali publicou textos sobre sua grande obssessão, a imagem do Ângelus, de Jean-François Millet (1814-1867), tema que ele duplicou em uma série de pinturas (1933-1935), como Gala e o Angelus de Millet Precedendo a Chegada Eminente das Anamorfoses Cônicas [Gala et l'Angelus de Millet precedant l'arrivée imminante des anamorphoses coniques] (1933, óleo/ tela, 24,2 cm x 19,2 cm, no acervo da The National Gallery of Canada). Dali publicou muito depois o texto do dito, manuscrito perdido, O Mito Trágico do Ângelus de Millet (1963), onde, através do seu Método Paranóico-Crítico de interpretação, o artista traçou, através de certo número de objetos e imagens, a dita, agressão sexual eminente das figuras na pintura de Millet, segundo sua própria interpretação. Nessa imagem, que Breton publicou na revista citada, Le SASDLR (n. 6, 15 de maio, 1933), Gala está sentada ao fundo, com os russos Lenin (Vladimir Ilytch Ulyanov, 1870-1904), na frente da porta atrás da qual se encontrava escondido Máxsim Gorki (1838-1936). No início de sua carreira Dali escreveu textos em catalão, publicados nas revistas espanholas da Catalunha, mas ainda pouco conhecidos e divulgados, pois o idioma foi banido da Espanha durante o regime ditatorial de Francisco Franco, que Dalí apoiou. No século XX os escritos de Dali voltaram a ser estudados, principalmente no Centro de Estudos Dali (Catalunha, Espanha), conforme citado por CANIZAL (CCBB, 2001). O artista sempre apresentou na obra e na vida extrema complexidade, pois trabalhou com incontáveis paradigmas, para citarmos somente alguns, como a estética da fome, a representação dos objetos e seus contrários, a transmutação dos fundos em imagens simultâneas e vice-versa com significados intercambiaveis nos quais existe a duplicidade da informação e das imagens. Nas obras de Dali, especialmente marcantes a androgenia das figuras masculina e feminina; a estética da imagem invertida no espelho; o duplo; várias alusões as representações arcaicas, através da disposição da composição de forma espiralada, que remete à arqueologia primária das representações desenhadas da linguagem inconsciente, escrita antes da criação do alfabeto, todos essas interpretações citadas (CANIZAL, CCBB, 2001). Aparecem nas pinturas os relógios moles de Dali, símbolo do comestível, que se assemelham na obra do pintor às formas antropomórficas de alimentos como ovos e carne. O simbolismo do sexual sempre presente, nos órgãos fálicos inúmeras vezes pintados de modo explícito, mas inseridos disfarçadamente no contexto formal da composição da obra, de modo que, para sua visualização é imprescindível pesquisar mais detidamente através do olhar, para identificarmos essa simbologia nas fascinantes imagens de Dali. O artista criou hologramas, esculturas, jóias preciosas como o coração pulsante de rubí com que ele presenteou Gala, sua mulher depois que abandonou o poeta Surrealista Paul Éluard, tudo com seu estilo inimitável e imaginação delirante. Dali foi único, artista transcendental das vanguardas artísticas do século XX, ainda que sua obra e personalidade se encontrem até hoje merecedores de vários tratados interpretativos devido à sua extrema riqueza e infinita complexidade. Dali publicou vários livros em francês, bem como inúmeros artigos, e suas ilustrações e desenhos foram publicados nas revistas Surrealistas; entre os livros de sua autoria destacamos A Mulher Visível [La Femme Visible] (1930) e O Amor e a Memória [L'Amour et la Mémoire] (1931). A fotografia de Salvador Dali com iluminação misteriosa, se encontra publicada (BEAUMELLE, 1991), bem como a reprodução de sua obra instigante, O Grande Masturbador [Le Grand Masturbateur] (1929), que pertence ao acervo do Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia (Madri). Devemos citar algumas outras obras intrigantes de Dali, reproduzidas (GAUNT, 1973): O Espectro de Vermeer de Delft que Podemos Usar como Mesa (1934); Subúrbios da Cidade Paranóico-Crítica (1936); o Telefone Lagosta, na Coleção Edward James (Londres), com lagosta laranja: a versão dessa obra, com a lagosta branca, esteve em exposição na mostra do Surrealismo, realizada no CCBB (Rio de Janeiro, RJ, 2001). Um grande conjunto da obra de Dali, inclusive suas esculturas gigantescas fundidas em bronze, a de um rinoceronte e a de uma mulher com o corpo cheio de gavetas, estiveram em exposição no MNBA (Rio de Janeiro, 1999). A obra de S. Dali Desintegração da Persistência da Memória (1952-1954) se encontra reproduzida (GAUNT, 1973): as obras Enigma do Desejo (1929, Zurique); o Ângelus Arquitetônico de Millet (1933, no acervo das Galerias Perls, Nova York); e a pintura Gala e Ângelus de Millet precedendo a chegada eminente das anamorfoses cônicas (1933, Galeria Nacional do Canadá, Ottawa), estão reproduzidas (ADES, 1978). A obra escultórica Pão Antropomórfico, foi reproduzida no catálogo da mostra da qual participou: O Sexo na Arte Féminimasculino [Le Sexe dans l'art, féminimasculin], realizada no MNAM (Paris, 1996), que também reproduziu vários fotogramas do filme de Dali e Buñuel, A Idade de Ouro [L'Âge D' Or]. Imprescindível visitar a mostra retrospectiva de Dalí, que, vinda do CCBB - Centro Cultural Banco do Brasil (Rio de Janeiro), inaugura no Instituto Tomie Othke (São Paulo, 18 de outubro, 2014). REFERÊNCIAS SELECIONADAS: BARRÉ, et al., op. cit, p. 95. DICIONÁRIO. DUDLEY, A; BADARSKY, D. The international Dictionary of Films and Filmmarkers. London: Papermac, 1984, pp. 15, 87. CATÁLOGO. ADES, D. Dada and Surrealism Reviewed. Introduction by David Syilvester and supplementary essay by Elizabetn Cowling. London: the Authors and the Art Council of Great Britain, Hayward Galleries, 1978. 475p.: il., pp. 258, 259 ils.9.2; 11.8; 11.9. CATÁLOGO. BEAUMELLE, A. de la; MONOD-FONTAINE, I.; SCHWEISGUTH, C. André Breton: La Beauté Convulsive. Paris: MNAM - CGP, 1991, pp. 195, 287. ENCICLOPÉDIA. KATZ, E. The Film Encyclopedia. Revised by Fred Klein and Ronald Dean Nolan. 3rd ed. New York: Harper - Perennial, 1999. 1586 p.: il. , p. 324. PALESTRA. CANIZAL, E. P. Arqueologias semânticas da imagem surrealista. Ciclo de palestras, associado à mostra do Surrealismo, gravadas em vídeo. Rio de Janeiro: CCBB, 2001. GAUNT, W. The Surrealists. London: Thames & Hudson, 1975. 272p.. il. pp. 155-175, 234-235. LÉVÊQUE, J-J. Le triomphe de l'art moderne: les Anées Folles. Paris: A. C. R. Éd. Internationalles, 1992. 624p.: il., retrs. p. 516. PIERRE, J. L'Univers Surréaliste. Paris: Éditions d'Art Aimery Somogy, 1983, p. 308.

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