GRUPO MUSICAL (INTERNACIONAL) DOS CINCO RUSSOS (Paris, 1907- 1929).
No começo do século XX dois grupos musicais marcaram as vanguardas francesas: o grupo dos russos, chamado pela crítica musical de Grupo dos Cinco e o grupo dos músicos franceses, chamado pela mesma crítica de Grupo do Seis (v.). Do grupo russo participaram Mili Balakirev (1837-1910), Modest Musorgsky (1839-1881), Cesar Antonovitch Cui (1835-1918), Nicolai Andrevitch Rimsky-Korsakov (1884-1908) e Aleksandr Porfirevitch Borodin (1833-1887).
Esse grupo de músicos e compositores foi responsável pelo retorno da música russa às raízes do primitivismo nacional, do retorno à terra, do resgate do folclore e da tradição do país há muito esquecidas na música russa, por conta da marcante influência da cultura francesa. Durante décadas, o idioma e a música francesa tornaram-se quase oficiais na cultura russa. O Grupo dos Cinco foi o maior promotor da música de raízes tipicamente russas, presente na reação nacionalista; e Serguei Diaghilev tornou-se seu maior divulgador, através da companhia que formou, a Compamhia Teatral S. P. Diaghilev, que patrocinou os Balés Russos. Que. em sua maioria, estrearam nos sofisticados palcos parisienses mas cujos espetáculos percorreram cidades, na Europa, dos EUA e América do Sul (B uenos Aires, São Paulo, 1916-1917).
O grupo dos músicos russos, reuniu-se para compor algumas obras conjuntas: quase todos os artistas pertenciam à rica e sofisticada sociedade de São Petersburgo. Na época reinava o Czar Nicolau II, este que tomou a importante decisão de abolir a Servidão (1861), que escravizava os camponeses russos. Esta reforma política e social não impediu as revoluções russas (1905; 1917), mas de certa forma adiou as conquistas do proletariado.
Nesta nova revolução de resgate da música nacional o Grupo dos Cinco foi apoiado pelo famoso crítico de arte Vladimir Stassov. Um dos músicos do grupo, Mili Balakirev, para lutar contra o Academicismo do Conservatório de São Petersburgo, inaugurou sua escola de música (1862-1872). Durante 10 anos o músico deu aulas gratuitas na sua escola, enquanto compunha seu poema sinfônico Thamar: esta obra foi encenada pelos Balés Russos (Paris, 1912; v.). No entanto, o fim da servidão dos camponeses arruinou o músico, que, decepcionado e sem sucesso, abandonou tudo (1872), para trabalhar até a morte como um obscuro funcionário de uma companhia ferroviária. Cesar Cui compôs 11 óperas; sua obra lírica Ângelo (1876) se baseou em um texto de Victor Hugo. O músico compôs peças corais, sinfônicas, música de câmara, obras para piano, além de várias canções para voz e piano (Lieder)
Durante 18 anos de trabalho contínuo, Aleksandr Borodin compôs a ópera épica Príncipe Igor, na qual incluiu as famosas Danças Polovetsianas, que Sergey Diaghilev apresentou nos palcos parisienses na sua dita, Semana Russa (1909). Borodin morreu subitamente; seus amigos Glazunov e N. Rimsky-Korsakov organizaram as partituras do compositor e terminaram a orquestração de Príncipe Igor. Borodin compôs 11 Lieder, dois quartetos de cordas,três sinfonias, sendo a última inacabada. O músico tornou-se muito conhecido no Ocidente por seu belíssimo poema sinfônico Nas Estepes da Ásia Central.
Rimsky-Korsakov deixou obra symphonic, principalmente lírica, cujo maior sucesso foi Shéhérezade, encenado pelos Balés Russos com a rica cenografia do russo Léon Bakst: parte de suas guaches cenográficas, encontram-se no acervo da Biblioteca da Ópera de Paris. Outras das obras sinfônicas de sucesso de Rimsky-Korsakov foi o Capricho Espanhol. O músico compôs o drama lírico A Donzela de Pskov (1868), com história baseada na revolta dos habitantes desta localidade russa contra o Czar Ivan, o Terrível. O músico compôs a ópera Sadko, passada na cidade de Novgorod e ressuscitou para a música russa um instrumento antigo, o guskli, uma espécie de cítara. Foi Rimsky-Korsakov quem compôs A lenda da cidade invisível de Kitsczh e da virgem Fevrônia, baseada em uma lenda popular da tradição oral de seu país. Finalmente, outra obra encenada pelos Balés Russos, com grande sucesso internacional foi a ópera O Galo de Ouro [Le Coq d'Or], na sua segunda versão para balé, com cenários de inspiração folclórica de Natália Goncharova, que deslumbraram Paris (1914). As fotografias dos desenhos cenográficos de N. Goncharova encontram-se reproduzidas (HAGER, 1986).
Aluno importante de Nikolay Rimsky-Korsakov, do Grupo dos Cinco (v.), foi Mikhail Ippolitov-Ivanov (1859-1935), que tornou-se professor de composição e harmonia, e diretor do Conservatório Musical de Tiflis (hoje, Tblisi, Armênia). Mais tarde ele tornou-se diretor de orquestra do Teatro Bolschoi e compôs o maravilhoso poema sinfônico Esboços Caucasianos (1894).
Foi graças à Rimsky-Korsakov que as óperas de seus amigos Mussorgsky e Borodin chegaram até o século XX; ele orquestrou-as e preparou-as para a posteridade, sem nada ganhar com isto, exceto muitas críticas na sua eépoca, e um reconhecimento póstumo. As críticas foram ocasionadas pelo fato do músico ter adaptado ou melhor corrigido, várias passagens originais destas obras. Rimsky-Korsakovfoi um grande músico, entre os maiores compositores russos, e tornou-se co-autor generoso e provavelmente as peças musicais tornaram-se obras melhores, mais completas e interessantes, e principalmente passíveis de serem executadas e não obras perdidas para as novas gerações.
Mussorgsky foi considerado como o mais importante compositor do Grupo dos Cinco: ele foi músico precoce. O artista estudou piano com M. Herke, professor do Conservatório Imperial de São Petersburgo. Mussogsky compôs sua primeira peça aos 14 anos de idade: foi A polca dos aspirantes. O músico foi apoiado pelo crítico V. Stassov e orientado por Balakirev ele escreveu várias peças para piano. A mais russa das óperas, Boris Godunov (1869) foi composição de Mussorgsky; ele escreveu Salammbô, baseado no romance do francês Gustave Flaubert; compôs a canção Noite, inspirada em poema de Alexander Pushkin e a Berceuse, inspirada em Ostrovsky, que iniciou o seu ciclo dito, de Canções infantis, com sete peças para canto e piano.
O compositor escreveu o poema sinfônico Uma Noite no Monte Calvo, inspirado em um livro de feitiçaria, que Mussorgsky leu: ele compôs Noite de São João [Nuit de St. Jean], em apenas doze dias. O músico passou estes dias e noites insone e terminou a composição justamente na noite de São João: poderíamos dizer que esta versão foi produto do automatismo psíquico dele, que André Breton celebrou depois nas artes (1920). No entanto não foi esta versão que chegou até nós, mas outra corrigida por Rimsky-Korsakov, composta à partir de varias versões do legado musical de Mussorgsky. O compositor debruçou-se sobre documentos históricos russos, re-organizando o texto original de Pushkin, de modo tal que resultou no resgate de temas de canções populares: Rimsky-Korsakov criou outros temas musicais que se tornaram populares.
A música mais conhecida de Mussorgsky foi Quadros de uma Exposição, que depois influenciou ao francês Claude Debussy; sua suíte ficou mais conhecida na orquestração magistral de Maurice Ravel, mais do que na forma original composta somente para piano. Kandinsky usou esta música para a apresentação de dezesseis aquarrelas Abstratas como cenário de apresentação no Teatro Friedrich (Dessau, 1928). Mussorgsky empobreceu, e, para sobreviver, passou à tocar piano como acompanhante da cantora Daria Leonova. Uma semana após a morte do escritor Fyodor Dostoievsky, Mussorgsky improvisou concerto de piano em homenagem ao falecido, na que foi sua última aparição pública. Dominado pelo alcoolismo, seu organismo debilitado não resistiu à comemoração: seus amigos internaram-no em um hospital: mas o músico faleceu poucos dias depois (16 mar., 1881). Mussorgsky foi um grande músico livre, liberal e liberado, tendo sido esta liberdade de criar e compor seu maior legado a seus sucessores; sua música representou grande influência na música de Claude Debussy e na de Igor Stravinsky, músicos cujas composições formaram a base da criação musical contemporânea.
REFERÊNCIASSELECIONADAS:
ÂNGELO, I. 85 anos de cultura. História da Sociedade de Cultura Artística. São Paulo: Studio Nobel, 1998, p. 266.
CHAMBERS, M. P. Biographical Dictionary. London: Melanie Parry, Chambers - Hanap, 1997, p. 471.
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LISTAGEM datilografada do Arquivo do Museu do Teatro Municipal de São Paulo. São Paulo: Museu do TMSP, 2000.
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